Há uns anos escrevi um texto sobre como a nossa vida se mede pelo pó assente nos móveis.
Como se a pressa fosse inimiga da limpeza e o pó assente, quieto, viesse confirmar que passamos pouco tempo em casa (preocupados em limpá-la, pelo menos) ou que passamos muito tempo fora dela. Indiferentemente, passamos tempo.E, mais do que confirmar se estamos ou não em casa, o pó assente nos móveis vem dizer-nos que já se passaram dias desde que limpámos pela última vez: vem dizer-nos que o tempo passa.
Sem nos apercebermos, as coisas vão desaparecendo, as histórias vão tomando outras proporções, as pessoas vão partindo para outros lugares dentro de nós. E quando parámos para olhar o relógio percebemos uma de duas coisas: ou nos parece que já passou muito tempo e na realidade ainda está tudo muito vivo, ou de facto não passou assim tanto mas ascoisas já secaram, já morreram, e deram lugar a uma nova realidade que desconhecíamos ser possível no imediato.
As melhores lições são as que se riem de nós: como é que podemos algum dia pensar que conhecemos alguém, se admitimos a maioria das vezes não nos conhecermos a nós mesmos?
A parte boa é que, a maioria das vezes, a vida nos surpreende, ou não teria tanta graça vivê-la.
E é tão bom quando nos apercebemos de que nos esquecemos de limpar o pó à nossa casa, a nós, simplesmente porque estamos demasiado ocupados para nos preocuparmos com a passagem do tempo; estamos a vivê-la.
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